sábado, 26 de enero de 2013

Entrevista a LuizRoberto Benedetti, sacerdote sociólogo brasileño.

Parte de la entrevista al sacerdote,sociólogo, Luiz Roberto Benedetti
IHU On-Line - O que esperar de um cenário em que, ao mesmo tempo, se diluem as bases tradicionais de pertença religiosa, a liberdade religiosa, o pluralismo e a secularização e se abre espaço para projetos religiosos de viés conservador e fundamentalista?
Luiz Benedetti - Para mim, aqui está a raiz dos problemas que a Igreja enfrenta. Discute-se realmente no interior da Igreja essas questões? O viés conservador se radica muito mais na ausência de discussão séria e competente para fazê-lo do que em posições doutrinárias que, conservadoras ou não, alimentem o debate e dinamizem a recepção ativa da ortodoxia e alimentem uma praxis criativa. Valha repetir o exemplo: a religiosas norte-americanas incomodam o aparato burocrático porque são competentes no exercício de seu serviço cristão e na capacidade de dialogar com o mundo. E aí vem a intervenção disciplinar, de caráter punitivo, ao invés de se deixar interrogar por uma postura social e eclesialmente responsável. Isso sem falar no levantamento prévio da suspeita.

Na atual conjuntura eclesial parece em curso um processo de mediocrização crescente: imposição acrítica da doutrina, a falta de uma hermenêutica séria na pregação da Palavra, valorização do espetáculo e pompas rituais, as grandes concentrações e a decadência de uma educação teológica de caráter sapiencial e reflexivo ilustram o quadro.
IHU On-Line - Quais os maiores desafios que a Igreja precisa enfrentar na contemporaneidade? Como ela tem feito isso, na sua opinião?
Luiz Benedetti - Diria, simplificando e muito, que a Igreja se encontra numa encruzilhada, num dilema: abrir-se ao mundo e dialogar com ele ou fechar-se sobre si mesma. No primeiro caso, precisa qualificar-se e sua política de silenciamento dos teólogos, de intervenção em grupos socialmente atuantes e gozando de reconhecimento social explícito (caso das religiosas americanas) mostra que não foi este o caminho escolhido. No segundo caso, fechar-se sobre si mesma, leva a refugiar-se em modelos institucionais de pensamento, ação e formação de quadros que deram certo numa determinada época histórica. Seminário, paróquia, o uso do latim como língua universal constituem aspectos sintomáticos de uma totalidade fechada e imune às interrogações da realidade. Sente-se na Igreja um centralismo crescente preocupado com sua autoreprodução. Um exemplo está na preocupação em fortalecer o status institucional católico da Caritas, fortalecendo sua identidade confessional até mesmo caminhando numa direção proselitista em um campo que sempre foi muito além do assistencialismo. Deu força a ações encarnadas e encarnatórias acima de horizontes ideológicos. Estes não podem ocupar o lugar que cabe à “Graça”. Mostrar-se católico, neste caso, pode aparecer como uma logomarca da ação caritativa (que não conhece horizontes confessionais-ideológicos). No campo da cultura, o “imbróglio”Universidade Católica do Peru caminha na mesma direção.
IHU On-Line - Como o senhor percebe a postura de Bento XVI de robustecer a Igreja Católica frente aos desafios impostos pelo avanço do pluralismo religioso e cultural?
Luiz Benedetti - Robustecer a Igreja num mundo de pluralismo religioso e cultural significa, antes de mais nada, preparar quadros qualificados para o diálogo adulto e responsável. E isso só é possível em clima de liberdade. Quando esta desaparece, ou pior, cede lugar ao medo, instaura-se a mediocridade, cria-se um saber de manual, de repetição de fórmulas. Pior: alimenta-se a imagem da Igreja como praticante de uma espécie de polícia do pensamento tão a gosto da imprensa que explora à saciedade esta faceta. Aliás, nem sempre de maneira justa. Só que não se pode esquecer: livros proibidos provocam corrida às livrarias e seus autores adquirem respeito e guarida em centros de produção de pensamento, que prezam acima de tudo a competência e honestidade intelectuais. Por outro lado, não se pode esquecer que esse quadro de mediocrização se generaliza cada vez mais no ambiente acadêmico como um todo.
IHU On-Line - Como o campo religioso católico brasileiro se articula com o cenário internacional da Igreja? Qual a especificidade do catolicismo brasileiro?
Luiz Benedetti - O último censo diz tudo. A sensação, pessoal, e, por que não, o temor, é o de uma Igreja que caminha para a irrelevância social. Mais adaptada ao mundo (que combate) do que parece. Fixemo-nos num dado: a prática cultual. Um padre mostrou-me a assembleia reunida para a Eucaristia e comentou: somos cada vez mais a Igreja das cabeças brancas. Referia-se a faixa etária dos participantes. O catolicismo brasileiro, na realidade, são catolicismos. Se tomarmos o catolicismo “oficial” (na falta de outro termo) a esperança reside no profetismo, num catolicismo de resistência, o mesmo que assumiu o Vaticano II, combateu a ditadura e luta pelo direito dos pobres. Nas comunidades, pouco visíveis, mas capazes de uma solidariedade pequena, despojada, mas que faz frente ao individualismo contemporâneo. Quanto ao catolicismo popular: o pentecostalismo se alimenta dele. Os cientistas sociais se perguntam: não será ele, em suas formas novas, um catolicismo rural urbanizado?
IHU On-Line - Fazendo uma breve retrospectiva da diversidade e da unidade da Igreja Católica e de seus dilemas entre o início da década de 1960 e a década de 1990, como o senhor percebe a Igreja hoje, em comparação a este período? Qual o espaço que ocupam hoje, para os fiéis católicos, as três vertentes básicas da instituição: Templo, Praça e Coração?
Luiz Benedetti - Nos anos 1960 a unidade se dava em termos de uma pastoral planejada, de atuação colegiada dos bispos. Havia uma “vanguarda” episcopal, nomeada por D. Armando Lombardi, que buscou entre os padres que eram assistentes da Ação Católica, bispos capazes de dar um novo perfil ao episcopado, sensíveis à dinâmica histórica, aos problemas da realidade social em transformação, capazes, no dizer de um acadêmico, de aprender com os leigos e escapar ao mundo da formação seminarística (no seminário não se podia ler Jacques Maritain). A consagração dessa realidade pelo Concílio Vaticano II, dando à colegialidade episcopal um papel “sacramental” foi radicalmente alterada com a “ligação” direta bispo-papa, a colegialidade reduzida a um agregado “afetivo”, a obediência livre e responsável substituída pela submissão em todos os níveis da vida religiosa católica, os movimentos de caráter emocional-intimista, doutrinariamente fundamentalistas alteraram radicalmente o quadro de “utopias” em ação dos anos 1960. Mas é preciso acrescentar. Nos anos 1960, as Igrejas oriundas da Reforma viviam a mesma efervescência. E se alimentavam umas às outras. As produções do Conselho Mundial de Igrejas eram lidas por nós. Hoje o mesmo processo ocorre ao inverso:
Templo: poucos jovens, rituais que seduzem menos pelo mistério e pela Palavra que pela pompa vazia e mentalidade rubricista.
Praça: os leigos estão no mundo, lugar de exercício de sua vocação batismal? Os ministérios leigos não representam uma saída para o verdadeiro problema que é a busca de novas formas de exercício do sacerdócio ministerial? Por isso mesmo, no momento não estão na praça. São clericalizados.
Coração: não se vê um horizonte favorável aos movimentos de caráter emocional. Há uma sensação, apenas uma sensação, de esgotamento. Mesmo porque são incapazes de agir sobre a sociedade em que surgiram e transformar a Igreja que lhes deu força. E mais: o forte componente emocional tende a se esgotar rapidamente e não deixar nada no seu lugar.
IHU On-Line - Qual o sentido do fundamentalismo religioso contemporâneo? Como ele se relaciona (e talvez se justifica) com outros fenômenos de nosso tempo?
Luiz Benedetti - Há que se escapar de uma visão que o vincula estreitamente às suas origens, fundadas na reação ao evangelismo liberal, à recusa de uma hermenêutica “moderna” na compreensão da Palavra de Deus. Ele é bem mais que isso. É uma atitude de vida, um modo de ser no mundo. Nesse sentido ele se apresenta como adesão irrestrita a um Grande Texto, assumido literalmente. Pode ser a Bíblia, o Alcorão, a própria Constituição de um país (um fundamentalismo tipicamente americano, no dizer de Agnes Heller). Apresenta-se como um modo de fazer frente a uma desordem e fragmentação internas, provocadas pela subjetivação intimista que faz do gosto pessoal o critério último da consciência moral. Mas é preciso perguntar: será que a sociedade recusa os parâmetros que a Igreja prega? Ela precisa deles e os solicita. O que ela recusa é a imposição pela violência – simbólica ou física. Mesmo porque esses parâmetros são funcionais. Eles delimitam o campo da ação “legítima” e, nesse sentido, “situam” num mapa significativo indivíduos e grupos. Os indivíduos sabem o que é certo ou errado. E isso traz segurança. Impede que sejamos, na expressão de Berger, “homeless mind” (um mundo sem lar). O que, em absoluto, não quer dizer que se norteiem pelos parâmetros propostos. Uma demonstração de que a sociedade não recusa verdades está na aceitação e difusão ampla da literatura de autoajuda, um tipo de guia que traz pronto um mundo no qual não é preciso pensar, refletir, escolher, decidir. A autoajuda dispensa o discernimento e a escolha. Responde ao homem moderno cuja angústia é ter que escolher.

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